quarta-feira, 11 de abril de 2007

Amizades

Recentemente uma boa e velha amiga voltou de uma temporada de uns 8 meses em Londres.

Nossa amizade transcende eras. Passamos pela turbulenta adolescência juntas; entramos na duvidosa 'idade adulta'-cheia de decisões sérias- ainda lado a lado. E hoje, já conhecidas como gente grande, permanecemos boas amigas.

Não nego que o contado diminui de maneira inversamente proporcional ao aumento de afazeres e responsabilidades. Contudo, o amor, a compreensão e o companheirismo ficaram intactos.

Por isso tudo, tiramos a distância de letra. E a saudade, embora grande, pôde ser satisfeira com e-mails, scraps e telefonemas.

Nestes últimos 8 meses, uma lição que a vida já havia me dado, mais uma vez foi reforçada: Ninguém é imprescindível - sempre damos um jeito de continuar em frente apesar da ausência e/ou distância. No entanto, algumas pessoas são insubstituíveis; e estas, de uma forma ou de outra, acabam deixando um grande buraco dentro do peito.

terça-feira, 27 de março de 2007

No Café

O café estava bem movimentado, e Andréa se escondia atrás de uma velha edição de Persuasão. Estava bem concentrada. Tanto que mal ouvia o som das xícaras sendou pousadas nos pires ou as vozes do casal que discutia três mesas a sua direita. Deliberadamente sentara em uma mesa no canto mais escondido do lugar, ao lado da porta do banheiro. Não queria ser vista. Não naquele estado. Quem a visse, até poderia pensar que Anne era mesmo o tipo de personagem que faz qualquer um chorar. No entanto, ela tinha outra razão para as lágrimas.

Marta, como sempre atrasada, finalmente chegará ao café. Esbaforida e preocupada, pelo atraso e com voz de sua querida amiga na ligação que marcava o encontro ali.

Demorou um tempinho depois de entrar no lugar para encontrar Andréa. Reconheceu-a por trás do livro pendurado no nariz. "Ah, não! Persuasão! O que será que aconteceu?", pensou enquanto se aproximava. Andréa tinha o hábito de reler este livro sempre que se chateava ou deprimia por algum motivo. E Marta nunca havia realmente conseguido entender como ou porque a leitura se Persuasão fazia tão bem a ela nestes momentos difíceis.

À visão de Marta em pé ao lado de sua mesa, Andréa fechou o livro e se pôs de pé. Seus olhos de tão inchados davam pena. Marta deu-lhe um abraço silencioso que durou uns bons segundos. Talvez um minuto inteiro. Quem sabe? Andréa já não podia medir o tempo. Ou a dor de cabeça que latejava suas têmporas.

Depois de se sentar e fazer seu pedido - "Um expresso e uma água com gás, por favor"- Marta esquadrinhou a mesa e viu o quanto sua amiga já parecia ter comido, e então a olhou nos olhos.

- Por isso você escolheu este canto, porque seus olhos estão inchados? Você detesta sentar aqui, perto do banheiro... Vai, me fala o que houve. - Tentou paracer calma, equilibrada e controlada. Umas das duas tinha que estar assim, apesar de geralmente não ser este o seu papel.

- Acabou, cara. Acabou. - Choramingou Andréa, com o tom menos embargado que podia fazer depois de aproximadamente 12 horas entre chorou e suspiros.

- O quê acabou? Não estou entendendo...Ah, Tiago? Acertei?

- Aham...

- Mas vocês nem estavam juntos direito. Achei que vc não gostasse dele. Pelo menos não o suficiente. Afinal, foi você mesma que sempre o manteve distante e tal. Que nunca quis nada sério...

- Pois é. Eu sei disso. Também achei que não gostasse dele o suficiente...Mas aparentemente gosto, e agora não dá mais tempo. Acabou. - Andréa deixou cair mais algumas lágrimas silenciosas.

- Olha, o Tiago é louco por você! É simples: vai lá e fala com ele. De verdade, sem fingimento, sem máscaras. Diz o que está sentindo. Tenho certeza que vai dar tudo certo. Você vai ver! - Queria parecer mais animada, mas não sabia se iria funcionar para animar a outra.

- Não. Não dá mais. Ele foi bem claro, e estava muito decidido. Acho que cansou de ficar em segundo plano na minha vida. Só acho que se ele se incomodava tanto, deveria ter dito alguma coisa antes, sabe? Não ter ficado quieto até o limite e simplesmente cair fora.

- É, mas... Bem, não teria adiantado muita coisa, né? - disse Marta com cautela. Não queria que, além de triste, Andréa ficasse irritada.

- Ah! Até parece! Claro que ter... - Parou de falar por alguns segundos e ficou pensativa, olhando para o nada. - Não. Tem razão. Não teria não. Poxa, eu sou assim tão egoísta? Meu Deus! Por isso ele terminou comigo...

- Você não é tão egoísta. Pára com isso! Você só não acredita muito em amor...Não neste amor romântico.

- Agora estou vendo que é real sofrer quando alguém te deixa. É como se tivesse uma mão invisível enfiada em meu corpo. Uma mão que não desiste de apertar minhas entranhas. Isso é uma novidade pra mim... Sempre achei este papo de sofrer por amor totalmente patético.

Andréa parou de falar e as duas ficaram em silêncio. De mãos dadas. O silêncio era compreensivo e consolador. Daquele tipo que só se dá entre duas almas ligadas.

Marta já havia terminado o café, e a garçonete retirava agora todas as louças de cima da mesa. Bebeu o último gole da água com gás e disse: - Vamos, dorme lá em casa. A gente dá uma caminhada na praia pra você espairecer. A brisa do mar vai te fazer bem. Muito mais do que a Anne e o Capitão Wentworth...

- Ah, pára de implicar com a Anne, ? O sofrimento dela é tão profundo. Sempre é maior do que o meu. Sei lá. Me faz sentir um romantismo diferente... - respondeu Andréa enquanto levantava e seguia Marta, que já pagara a conta, para fora do café.

Após saírem, Marta pegou o braço da amiga, segurou bem perto e perguntou: "E aí? Como está se sentindo?" Ao que Andréa respondeu: "Patética!"

quinta-feira, 22 de março de 2007

Fala Recolhida

"Emília engoliu a pílula muito bem engolida, e começou a falar no mesmo instante. E falou, falou, falou mais de uma hora sem parar. Falou tanto que Narizinho, atordoada, disse ao doutor que era melhor fazê-la vomitar aquela pílula e engolir outra mais fraca.

- Não é preciso - explicou o grande médico. Ela que fale até cansar. Depois de algumas horas de falação, sossega e fica como toda gente. Isso é 'fala recolhida', que tem que ser botada pra fora."

(LOBATO, J.M.B. Reinações de Narizinho)


"Na fala de cada um de nós cruzam-se muitas outras já que, ao falar, nós falamos nosso próprio tempo, nossa cultura, nosso meio social, as leituras que fizemos e as leis socias que nos formaram."

(CERDEIRA, A. ANDREIUOLO,B. Subjetividade em Questão)


Depois de um bom tempo em silêncio, resolvi falar outra vez.

Quando eu era criança, todos aqui em casa brincavam que eu tinha tomado a pílula do Dr Caramujo. Enfim, acho que tomei mesmo.

Vamos ver se coloco pra fora toda esta "fala recolhida".

Bem vindos ao meu novo lar virtual!

Bjs!